Justiça previdenciária: hora de reparar a distorção que penaliza os servidores aposentados

por | Sem categoria

Enquanto seguimos acompanhando as movimentações do governo federal na busca por um sistema tributário mais justo, como a ampliação da faixa de isenção do Imposto de Renda e a eventual taxação de grandes fortunas, há um ponto que não pode mais permanecer à margem do debate: a cobrança da contribuição previdenciária sobre aposentados e pensionistas do serviço público. Uma distorção que, embora antiga, clama hoje por uma correção urgente.

Como advogada e professora de Direito, posso afirmar com segurança: trata-se de um dos maiores paradoxos da justiça fiscal brasileira.

A natureza controversa da cobrança: contribuição sem contrapartida

Desde 2003, os servidores públicos aposentados passaram a contribuir com a previdência, inicialmente sob o argumento de necessidade fiscal e caráter excepcional. No entanto, o que era para ser provisório tornou-se regra, e pior: injusta.

Essa contribuição incide mesmo quando não há mais expectativa de benefício futuro, o que descaracteriza o princípio da contrapartida contributiva, essencial à lógica do sistema previdenciário. Ou seja: estamos diante de um tributo que onera quem já cumpriu seu dever para com o Estado, em uma fase da vida marcada por aumento nas despesas com saúde e redução de renda.

PEC 6/2024: uma proposta sensata, gradual e viável

A Proposta de Emenda à Constituição nº 6/2024, a chamada PEC Social, traz um alento. Ela prevê a extinção gradual da contribuição previdenciária dos inativos, começando aos 66 anos para homens e aos 63 anos para mulheres, reduzindo um décimo ao ano até zerar aos 75.

É um modelo que respeita os princípios da equidade e da progressividade, sem comprometer de forma irresponsável o equilíbrio fiscal. Pelo contrário: o impacto estimado de R$ 6 bilhões no primeiro ano é perfeitamente administrável diante da recente recuperação de R$ 244 bilhões pela Advocacia-Geral da União.

A lógica econômica da reparação: mais consumo, mais arrecadação

A PEC não representa apenas justiça social — ela também é racional do ponto de vista econômico. Colocar mais recursos nas mãos de aposentados é ativar o consumo local, impulsionar pequenos comércios, serviços essenciais e, por consequência, ampliar a base tributária sobre o consumo e a renda. A medida, portanto, se retroalimenta com efeitos positivos sobre a arrecadação.

Minha experiência me mostrou que políticas que fortalecem o poder de compra da população idosa geram impactos multiplicadores e sustentáveis na economia.

A hora da decisão política: apoio popular e parlamentar em alta

A proposta já conta com apoio robusto: mais de 200 parlamentares subscreveram requerimento de apensamento da PEC 6/2024 à antiga PEC 555/2006, que dorme há quase 20 anos no Congresso. O clamor popular também é inequívoco: 98% dos participantes de enquete da Câmara manifestaram-se favoravelmente à proposta.

Esse apoio revela um consenso nacional de que a manutenção dessa cobrança sobre aposentados é uma ferida aberta na estrutura tributária brasileira.

Reflexão final

Como professora e advogada, acredito que o conhecimento técnico é a chave para transformar a prática jurídica. E neste caso, temos uma oportunidade concreta de reverter uma injustiça histórica, com base em dados, equidade e racionalidade econômica.

O Congresso Nacional tem agora uma decisão emblemática diante de si: perpetuar uma distorção que agrava a vulnerabilidade de quem já contribuiu por décadas, ou inaugurar um novo ciclo de justiça fiscal, no qual ninguém, nem os aposentados do serviço público, será deixado para trás.

Que esta reparação não demore mais uma geração para ser feita.

Acompanhe nossos conteúdos e fique por dentro das principais discussões que moldam o Direito Público e Previdenciário no Brasil. Aqui, nosso compromisso é com a técnica, a ética e a transformação social por meio da prática jurídica.

Assine a Newsletter da Suzani Ferraro

Cadastre-se em nossa lista de e-mails para receber notícias, atualizações, cursos e congressos

 

Você foi inscrito com sucesso!

× Como posso te ajudar?